Vocês já viram um limão com vontade própria? Eu não, mas soube de um. Aconteceu na semana passada com a minha vizinha de seis anos. Abri a porta e dei de cara com a Yasmim chorando e foi difícil me controlar para não rir daquela coisinha de bochechas gordas, borrando toda a sua maquiagem de palhaço. Era dia do circo e as professoras fizeram essa surpresa para a criançada. “Que aconteceu, Yasmim?”. Entre soluços e fungadas ela me contou que um limão não sabia se queria servir de suco para ela. No Pré-III eu conversava com a pia do banheiro e via sombras andando pelas paredes de casa, então achei que fosse coisa da idade e me ofereci para acertar as contas com o limão. Mas não éramos tão parecidas assim, já que ela agradeceu, mas recusou a minha ajuda. Disse que era um assunto que deveria resolver sozinha com o limão. Ver uma criança auto-suficiente me dá raiva. Não dela, mas de mim, que sempre fui uma tonta incapaz de solucionar os problemas da infância sozinha! Uma bronca da professora se traduzia
Logo soube que Yasmim só havia tocado a minha campainha para pedir uma música. “E desde quando você conhece Mombojó?” E essa malandra ainda tem um gosto musical bacana! Só faltava fumar e discutir o cinema de Antonioni tomando cappuccino! O limão havia contado que gostava das músicas do Mombojó. Emprestei o primeiro álbum.
Naquela noite Yasmim ligaria o radinho do seu quarto para ouvir a faixa oito, Adelaide. Apagaria a luz e esperaria pelo sono contando limõezinhos espremidos em uma jarra de suco transparente. Eu sentaria para tomar uma cerveja com os amigos, porque de caipirinha já enjoei (elas são todas iguais!) e pensaria em uma maneira de fazer Yasmim colocar esse limão contra a parede. Se ele não quisesse virar suco, que tivesse a coragem de dizer, assim ela poderia abrir a geladeira a pegar uma maçã.